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"White Christmas": a canção de Irving Berlin em dois musicais de Hollywood

Há exatos setenta anos, o compositor Irving Berlin escreveu esta que considero a mais linda canção de Natal de todos os tempos. "White Christmas" foi apresentada ao público pela primeira vez por meio da poderosa voz de Bing Crosby, numa apresentação do artista no show The Kraft Music Hall, veiculado pela rádio NBC no Natal de 1941.
No entanto, a música começou a trilhar carreira de sucesso (também na voz de Bing Crosby) apenas em meados de 1942, ao circular comercialmente no álbum com as canções do recém-lançado filme musical "Holiday Inn", protagonizado por Crosby e Fred Astaire. Lançado o filme, "White Christmas" competiu pela preferência do público com "Be careful, it's my heart", outra canção bem Irving Berlin, singela e linda. Porém, hoje o espaço é da primeira, pois já estamos em contagem regressiva para a chegada do Papai Noel e compartilhamos com os norte-americanos dos anos 40 da ânsia por canções que definam essa magia quase tangível que acompanha o Natal.
"Holiday Inn" foi lançado nos Estados Unidos em agosto de 1942. Pouco mais de um mês antes do Natal de 1942, a canção tornou-se a preferida dos ouvintes segundo vários hit parades do país, incluindo a rádio das Forças Armadas, inundada com pedidos da música, segundo registros. Hoje, seu single é considerado o mais bem vendido de todos os tempos, com impressionantes 50 milhões de cópias vendidas no mundo todo.
Trago essas informações históricas (emprestadas do canal do You Tube que apresenta a primeira versão da música para as telas) para pensar nos vários sentidos que "White Christmas" ganhou com o passar dos tempos. Naquele 1942 e anos subsequentes, ela ajudou a aquietar corações de soldados e familiares divididos pela 2ª Guerra. Seu eu-lírico pode bem ser considerado um daqueles jovens que partiam para o horror desconhecido munidos daquele patriotismo exacerbado que os americanos sabem como ninguém ostentar, e, distante de sua terra e de seus entes queridos, sonhava com os "Natais Brancos" de outrora: "Eu sonho com um Natal Branco/ Igual àqueles que eu conhecia/ Onde os topos das árvores brilham/ E as crianças ficam atentas/ Para ouvir os trenós na neve". Tranquilos que não vou mais continuar a minha tradução paupérrima da canção - para não ser acusada daquilo que critico: as versões malfeitas que não conseguem repor nem o sentido, nem a poesia dos originais. Fiquem com a obra-prima:
I'm dreaming of a white Christmas
Just like the ones I used to know
Where the treetops glisten,
and children listen
To hear sleigh bells in the snow
I'm dreaming of a white Christmas
With every Christmas I write
May your days be merry and bright
And may all your Christmases be white
Com duas estrofes e nove versos e a descrição de um pequeno quadro de felicidade familiar, Berlin conseguiu como nenhum outro suavizar a atmosfera de tensão da época. Interessante é que o primeiro uso cinematográfico da música não a relacionou à Guerra.

"Holiday Inn" também não tematiza o Natal - embora a data abra e feche a película que narra as aventuras e desventuras amorosas de um par de comediantes (protagonizados por Fred e Bing, dois dos artistas mais badalados do show bizz no momento). O título refere-se à pousada/restaurante administrada pela personagem de Bing, que, curado de um recente ataque de nervos, decide fundar um estabelecimento que apenas precise abrir nos feriados nacionais. E assim, Mark Sandrich (diretor de 5 das 10 películas de Ginger Rogers & Fred Astaire - só isso já serve para recomendá-lo) faz desfilar em frente ao espectador uma patriótica parada em comemoração às datas principais do calendário americano: Dia de Ação de Graças, 4 de julho, aniversário de Abraham Lincon, Páscoa, etc.
O humor que perpassa a história é quebrado nos dois momentos em que "White Christmas" é apresentada, os quais narram com a mesma doçura dois momentos fundamentais para as personagens de Bing Crosby e Virginia Dale: primeiro, quando os dois começam a se conhecer enquanto dividem de modo familiar uma noite de Natal na pousada em vias de ser inaugurada; e segundo, o reencontro de ambos, já apaixonados, na frieza do estúdio de Hollywood que transforma em filme a já então bem-sucedida pousada. A união do casal, debaixo da reprimenda do diretor, ressalta ainda uma vez o clima de acolhimento familiar promovido pela música. Mais que a badalação da Meca do cinema, a qual copiava (e copiava às vezes mal, segundo a personagem de Crosby) a realidade, tudo o que os pombinhos precisavam era um do outro. Sim, é piegas, mas funciona perfeitamente. 

"White Christmas" deu nome a um típico filme de Natal que começou a ser exibido nos Estados Unidos em outubro de 1954 - isto, bem como o fato de o nome do compositor anteceder o título do filme, patenteiam como Berlim e sua música gozavam da admiração do público.
Nesta película, a 2ª Grande Guerra ocupa papel de destaque, quem sabe, mimetizando a importância que a canção tivera naqueles últimos anos da conflagração.
"White Christmas" trata de modo quase que documental das confraternizações que aconteciam no front e dos destinos de seus combatentes. Talvez por isso, eu não consigo deixar de ficar engasgada sempre que ouço Bing Crosby cantando-a entre escombros, acompanhado apenas por uma caixinha de música e tendo como pano de fundo um conflito que não dá trégua.
O patriotismo tipicamente americano aparece nesta obra na defesa dos generais do passado - homens que, embora tenham comandado exércitos vencedores na Guerra, não encontravam trabalho naqueles anos 50. A visada crítica não torna, entretanto, a história amarga. Ao contrário, ela brilha, especialmente devido às presenças de Vera-Ellen e Danny Kaye, que, além de dançarem como ninguém, estão divertidíssimos como dois artistas do teatro cômico-musicado que não querem saber de compromisso mas - oh, graciosa obviedade - descobrem no final que não podem viver separados. E, antes de tudo, há a voz de Bing Crosby, levando "White Christmas" a se sobrepor aos ruídos da Guerra.
*
Antes de apresentar a cena, quero deixar a todos os amigos queridos que passam por aqui meus mais sinceros votos de um Feliz Natal. Quer seja ele um Natal Branco, com direito à construção de bonecos de neve e regado à bebidas quentes, quer seja um Natal colorido, iluminado pelo céu azul do verão - que chega aqui nos trópicos mais animado do que nunca. Desejo-lhes um Natal cheio de paz, seja ela encontrada em meio à família numerosa, em clima de festa, com troca de presentes e as crianças esperando o Bom Velhinho, seja ela encontrada na quietude do lar, num jantar simples do qual compartilham apenas os de casa. O meu, mesmo abafado, terá como trilha sonora "White Christmas" e outras maravilhas criadas pelos grandes compositores americanos, as quais, mesmo pintando cenários que nos são estranhos, definem lindamente o espírito natalino. Espero que nos encontremos no ano que vem com a mesma frequência e entusiasmo com que nos encontramos durante todo este ano!

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